quinta-feira, junho 30, 2005

Os Quinhentos

Escrito por Eduardo Pitta em daliteratura.blogspot.com


No momento em que a SIC Notícias deu o «directo», a perplexidade foi geral. Um arrastão na praia de Carcavelos? Envolvendo 500 indivíduos? O que é um arrastão...? Explicada a natureza do arrastão, a televisão, o mais que conseguiu, foi entrevistar banhistas que «não tinham» visto nada, e um empregado de bar, ou coisa parecida, que relatou vagamente o sucedido, referindo «centenas de pessoas». Percebeu-se logo que dizia «pessoas» para não dizer negros. Entalada entre o Forte de São Julião da Barra e a Ponta da Rana, a praia de Carcavelos tem um areal generoso: quilómetro e meio de ponta a ponta, cem metros de largo em dois terços da extensão. É a maior praia da linha do Estoril, só ultrapassada na região de Lisboa pela Costa da Caparica. Cabe lá muita gente: 30 mil banhistas foi o número apontado para essa tarde. Era o feriado do 10 de Junho, o dia estava tórrido. Não sei se o número é exacto. Sei que bastava metade desse número para impossibilitar, repito, impossibilitar, uma «maratona» de 500 indivíduos. Quinhentos indivíduos é o equivalente a quatro companhias do exército, ou, se preferirem, o equivalente a um batalhão (4x125). Ninguém, nos media, parou um minuto para pensar na evidência: o gang era um batalhão... Com o areal coberto, como é que um batalhão atravessa a praia? Passa por cima. À bruta. E ninguém reage? Afinal de contas, o arrastão não é uma dança de salão. O método não era de excluir. Mas como de tudo resultaram três feridos (um polícia, uma mulher que cortou o pé esquerdo num caco de vidro, e uma rapariga que levou uma cacetada por engano), um queixoso (um emigrante do Leste que ficou sem o fio de ouro), e três ou quatro detenções sem consequência, temos de concluir que foi um curioso arrastão. Tão curioso que os 500 indivíduos desapareceram todos num ralo. Já tínhamos a inventona, agora temos também a arrastona. Até aqui tudo releva do «disparate»: inépcia jornalística, contra-informação, etc. No dia seguinte, a BBC e a CNN mostraram imagens da polícia no areal, arma em riste, e grupos de rapazes negros. Mais histerismo. Anteontem os 500 já eram 70, e hoje parece que são «perto de 40». O busílis não é o arrastão. O busílis é que o arrastão chegou ao Parlamento num tom que não prenuncia nada de bom: «500 delinquentes negros», adjectivos fortes, etc. Aquilo que parecia uma «manobra» falhada (muito mal explicada pela polícia), uma «manobra» que os media «venderam» sem se dar ao trabalho de tentar juntar as pontas soltas, ganha contornos extremamente inquietantes. O pior é que pode ser um ponto de não-retorno.

quarta-feira, junho 22, 2005

Haverá país como este?


(Clicar na imagem)

ESTA imagem continua actual, cinco anos depois.

Foi-me enviada com a seguinte explicação:

«Fui recentemente aos Correios na Baixa de Lisboa e fui atendida por uma dessas novas funcionárias dos Palops. (...) perguntou o nome para colocar no recibo.

Sem dar importância, disse-lhe que deixasse em branco. Agora poderão ver (...) o que a funcionária escreveu no local do meu nome.

Maria Orlanda da Fonseca Rodrigues»



A sociedade actual...

"Dois amigos passeiam numa floresta. De súbito, ao longe, um tigre avista-os e avança na sua direcção.

Rapidamente, um deles abre a mochila, tira um par de ténis, e começa a calçá-los.

«Pensas correr mais depressa do que o tigre por causa desses ténis?!» - pergunta o outro, a tremer.

«Não, só quero é correr mais depressa do que tu»

segunda-feira, junho 13, 2005

Arrastão

Para ler com atenção o post de Pacheco Pereira e o comentário de Miguel Morujo.

"DAS DUAS, UMA

Ou a polícia está completamente cega quanto ao que se passa em certos bairros de Lisboa e não tem um informador sequer que a previna de algo que mobilizou quinhentas pessoas, ou seja que milhares souberam com antecedência; ou toda esta história está mal contada e não são quinhentos, nem foi combinado, e alguma coisa aconteceu na praia que não aparece nos jornais. Há uma terceira hipótese que me parece tão absurda que a recuso: a polícia sabia e não fez nada.

O ministro tem muitas explicações a dar e depressa."

José Pacheco Pereira

*

"Sobre o seu post «Das duas uma» e lendo o DN, parece de facto que a história não foi bem contada, pelo menos nas televisões:

«O pânico gerou-se ontem ao início da tarde na praia de Carcavelos, quando centenas de indivíduos, em bandos, começaram de repente a assaltar e a agredir os banhistas. [...] Os distúrbios terão tido início quando uma bando roubou um fio de ouro a um imigrante de Leste, espancando-o, contou ao DN Bruno Marques, um dos banhistas presentes no local. Esta situação foi testemunhada pela responsável de um café da zona, que logo fechou o estabelecimento e chamou a polícia. O tempo de chegada das forças de segurança, ainda que curto, foi suficiente para que, como que por simpatia, outros bandos que ali tomavam banhos de sol aproveitassem a oportunidade para tentar a sua sorte. Gerou-se, então, o caos. Várias crianças perderam-se dos pais, com os bandos a assaltarem quem estivesse mais a jeito, agredindo os que ofereciam resistência.
Nada fazia prever que aquela onda de violência surgisse tão de repente. De acordo com fonte policial, os bandos eram banhistas que, aliás, são frequentadores habituais daquela praia. "Reagiram por simpatia ao verificarem a oportunidade", contou. Não houve, portanto, nenhum assalto organizado à praia, nem qualquer estratégia concertada entre gangs. "A pólvora estava lá e bastou que alguém acendesse o rastilho", explicou o interlocutor do DN.»

De facto, é "interessante" que nenhuma televisão, nas reportagens que vi, tenha colocado ênfase à aparente espontaneidade do "arrastão". E mais: que não houve assalto organizado..."

Miguel Marujo

Reprise!!!

Eu já sabia que isto ia acontecer

Que Tragédia!!!!

O tacho, qual tacho? GALP? Glup

terça-feira, junho 07, 2005

"O Cobrador de Impostos"

«Deixa-me dizer-te como é que vai ser:

É um para ti, dezanove para mim,

Porque eu sou o cobrador-de-impostos.

Se 5% te parece pouco,

Agradece eu não te levar tudo.

Se guias um carro, eu taxo-te a rua;

Se tentares sentar-te, eu taxo-te o assento;

Se tiveres frio, eu taxo-te o aquecimento;

Se fores dar uma volta, eu taxo-te os pés,

Porque eu sou o cobrador-de-impostos.

Não me perguntes para que é que eu os quero,

Se não queres ainda pagar mais;

Agora, o meu conselho aos que morrem:

Declarem o valor dos vossos olhos,

Porque eu sou o cobrador-de-impostos

E é só para mim que vocês trabalham,

O cobrador-de-impostos."

The Beatles, 1966

segunda-feira, junho 06, 2005

Referendo Francês

Para ler com atenção a opinião de Jacques Attali no L'Express de 06 / 06 / 2005.

"Notre pays ne pourra rester deux ans de plus dans une double précarité - économique et politique - sans dommages irréversibles


Voici qu'à la précarité sociale, qui a provoqué le refus de la Constitution européenne, le président répond par la précarité politique, qui pourrait un jour entraîner le refus de la République.


Le marché, fondé sur la liberté de choix des acteurs économiques, entraîne la réversibilité de leurs décisions et provoque la précarité des emplois, des implantations industrielles et des placements financiers. En poussant, par le jeu de la concurrence, à l'innovation, le marché transforme même cette précarité en une tyrannie du neuf, qui s'installe peu à peu dans tous les domaines de la vie économique, sociale, culturelle et privée. Et, au total, la précarité n'est donc plus un effet secondaire de la mondialisation, mais bien l'autre nom de la liberté. En étant incapables de mettre en place des moyens d'en protéger les peuples, les gouvernants poussent les électeurs à accepter d'échanger des libertés contre de la sécurité. Ainsi, ce n'est pas un hasard si les moins diplômés, c'est-à-dire les moins bien préparés à supporter le changement, ont voté non au référendum. Ni si les rares régions où le neuf est encore synonyme de progrès ont voté oui.


La démocratie, fondée sur la liberté de choix des électeurs, installe la précarité des gouvernants et ajoute à l'incertitude des gouvernés. Aujourd'hui plus encore, en France, à un moment où, plus que jamais, le pays a besoin qu'on lui montre la route vers une liberté protégée, voici que la politique se réduit à une lutte à mort entre les deux meilleurs talents de la droite et entre les meilleurs espoirs de la gauche.


Ce n'est donc pas non plus un hasard si les citoyens les plus menacés de précarité économique votent pour ceux, extrémistes de gauche comme de droite, qui laissent entendre que la précarité pourrait disparaître avec la fermeture des frontières et la réduction des libertés.


Notre pays ne pourra rester deux ans de plus dans cette double précarité sans dommages irréversibles, c'est-à-dire sans ouvrir un boulevard à une alliance brun-rouge, même si celle-ci se déguise en bleu ou en rose.


Afin d'éviter cela, il serait urgent que la classe politique se mette au travail pour proposer au pays des programmes permettant de maintenir le goût du risque tout en protégeant contre ses effets les plus pervers. Cela passe par des réformes très audacieuses, touchant à la pratique démocratique, à l'émergence de nouveaux champs d'économie hors marché, par la mise en place de mécanismes efficaces et justes de protection contre les risques du chômage et par l'incitation à la reconversion et à la création d'entreprises individuelles. Cela suppose, par exemple, qu'un chômeur se voie reconnaître un statut de travailleur s'il accepte de recevoir durablement une formation qualifiante, aussi exigeante et rémunératrice qu'un emploi.


Il y faudrait pour cela du courage et du temps. Deux des denrées les plus rares, par les temps qui courent."