quarta-feira, maio 05, 2004

Condecorações

Regra geral, logo que eleitos os presidentes anunciam sempre a intenção de representar até os que não votaram em si. Sucede que por pensamentos ou palavras, actos ou omissões, esquecem-se da promessa poucos dias depois.
Lembrei-me disto com a recente atribuição da Ordem da Liberdade à senhora Isabel do Carmo. Estranho bastante que uma condecoração que visa “distinguir serviços relevantes prestados em defesa dos valores da civilização, em prol da dignificação do homem e à causa da liberdade” seja entregue a alguém que tem responsabilidades directas no clima de caos e anarquia que Portugal viveu até ao 25 de Novembro. A menos que, entre tantos comendadores de mérito mais que duvidoso, exista já alguma dificuldade em encontrar candidatos.
Para os mais esquecidos lembro que a senhora foi uma dirigente emblemática do Partido Revolucionário do Proletariado – Brigadas Revolucionárias ( PRP-BR ). Entre as suas aventuras contam-se um ataque às instalações da NATO no Pinhal do Arneiro – Fonte da Telha e a uma bateria de canhões ( também integradas no dispositivo da NATO ) em S. António da Charneca – Barreiro. Como era de prever, tais actividades alertaram os Serviços Secretos Militares ocidentais, do Canadá à Turquia, onde passou a estar fichada com a classificação de “terrorista” e a ter vigilância personalizada. Em 1976, a Judiciária e a Secreta Militar, depois de uma vigilância apertada à dupla Carlos Antunes/Isabel do Carmo, concluem que os militantes do PRP-BR os autores dos assaltos a bancos, justificados pela necessidade de obtenção de fundos para armar a classe operária. Até meados de 1978, o PRP-BR terá sido responsável por mais de 30 acções violentas: assaltos à mão armada, quer em bancos, quer em esquadras da PSP, e a morte de um agente da Judiciária. O resto é bem conhecido e faz parte dos nossos hábitos: amnistias, amnistias e amnistias e ninguém foi responsabilizado pela morte do agente Carvalho.
Perante tudo isto, a senhora jamais deu sinais de alguma evolução ideológica e não parece arrependida com os actos do passado. Pelo contrário, parou no tempo e continua a creditar nos perigos do fascismo, em lutas de classes e em revoluções populares.
No intervalo de alguma saída ao estrangeiro, Jorge Sampaio deveria justificar a condecoração às altas instâncias da NATO. Ah, e explicar à família a razão na não atribuição, a nível póstumo, da Ordem da Liberdade ao agente Carvalho.